Final

Author: Henrique Alvez /


   Destinada a funesta prisão sem fim, a existência em forma de símbolo faz-se distante e despede-se energicamente,  partindo sem sair do lugar. Avança mil passos ainda que não mova um só pé e some no horizonte da alma que insistem dizer que em ele reside, sem perder a nitidez sob seu atento e cansado olhar. O membro que um dia foi percorrido por suas mãos quentes agora tomba friamente no chão enquanto ergue-se em um clamor desesperado por um último sopro de inspiração. Já a vida desfavorecida a favor do afortunado faz-se ferozmente flácida em refutação a felicidade e esquece-se de manter o padrão, mas quando se toca, flagra-se em rotina intransponível.
   No passo em que a taxativa substituição vem inverídica, a relação um dia utopizada decai rumo ao mármore incandescente diluindo aos poucos enquanto assistida de costas por aquilo que um dia proferiu a infindável duração disto em corrente extinção.

Albiníssimo

Author: Henrique Alvez /

Claros dias de frio veraneio
Estação conturbada perdurante por séculos passados em minutos
Unidade infinita característica à quimérica quimera sonhadora
Morticínio aflitivo desejado morto fortemente por vivente
Maravilha da terra gêmea geme em agonia
Advenha desventurada e contorcida trazida da desgraça           

A melodia infernal valsa sobre martelos e bigornas sem qualquer sutileza
Labirinto infinito de canção vermífuga provinda das ermas profundezas
Aquela que seduz e acalma cada pulsação  na particulada anatomia
Desfigurada figura figurada em gravura de utopia

Eu pluralizado e multiplicado
Seu original conservado em ecoante cárcere
Metafórico poliéster em camada imperturbável

Transitoriedade de Pícaro

Author: Henrique Alvez /

Me chamam solidão
Estendido em leito utópico
Em quimérico morticínio
de quimeras irrealizáveis

Pelos ruídos repetidos
acesso as memórias
daquilo que ainda não se suscedeu
E quando o aconchego converte-se em toalha
Afundo-me na busca por substituir
aquilo que conheço ser insubstituível

Quem dera fosse o passado
bem retornável.
Busco o resgate daquilo que
o inexistente desperta
Metal invisível
Moldado em esteriótipo plástico
Instrumento inexorável
da desejada recuperação
de emoções imaturáveis
Sentimentos maculáveis
maculados

A toalha noturna seca o que a superfície tocou,
Aquela pintada de branco
manchada pelo mesmo preto escorrido
sob o vermelho daquele sorriso inesgotável
sem valor e já debatido

E aquilo que o desconhecido desperta
Afasta-se pelas próprias mãos
E apesar de relutar
Apesar de internamente talvez lutar
Desvencilha-se insensível
Do tal metal invisível

Carga emocional de marmota
Contra humana terrivelmente encravada
Lã em patas felinas
Plástico em dentes recém formados

Tola confusão sentimental e transitória
Redundância vil em torno de dúvida
Dúvida em torno de lâmina
Lâmina em torno de alma
Alma em torno de nada

O Pícaro amaldiçoado troca suas vestes falsas
E enquanto o corpo mantém-se
O interior explode em um sapateado corrosivo
Observado de perto sem ser percebido

E quem dera a cachoeira negra
A que mancha a pele de palidez sintética
Pudesse correr até atingir-lhe o âmago
Para que este também se corrompesse
Eternamente

Lemingue

Author: Henrique Alvez /

Já havia decidido isso no momento em que a maior revelação que poderia ter-me sido feita veio à tona. Mesmo assim demorei a efetivamente mover meu corpo para o que seria seu fim. Sim, estou a caminho do suicídio.
   
Sei, parece artificial quando falo sobre o assunto tão deliberadamente, mas acontece que é uma idéia tão antiga que repousa em minha mente, que talvez já tenha me acostumado a ela.
  
 Estamos no mês de Junho, um inverno maldito de frio cortante e chuvas mal-vindas em uma bosta de cidade que mal me atrevo a proferir o nome. Acordo cedo como de costume às quatro da manhã, assisto às aulas que preciso assistir na escola, me despeço de meus amigos e parentes dissimulados, volto pra casa e torno a sair arrastando os pés de forma similar a meu ranger de dentes.
    
Já a caminho do anjo negro, levo comigo a mochila abarrotada com alguns objetos supérfluos os quais vejo necessidade de me despedir antes da derradeira partida. Supérfluos sim, porém mais valiosos que muitos indivíduos que deixarei para trás.
    
Sou pobre em expressar meus sentimentos, mesmo quando tento descrevê-los em palavras, por isso pareço um pouco sistemático e frio falando sobre futuro óbito, mas acredite em mim quando digo que tenho sérios pretextos e minha tristeza não cabe em mim de tão grande. Na verdade, mancho as páginas que escrevo com meu pesar liquefeito. Tremo a caneta a cada linha que precisa ser traçada para formar o veículo imperturbável que servirá de legado aos que por algum motivo possam sentir a falta de alguém tão desirmanado e fora do mundo real.
  
                                            ***

   O prédio era um dos maiores da cidade, o que não significava muita coisa. Peguei o elevador assim que pisei no hall de entrada, passando despercebido pelos seguranças ineptos da portaria de vidro.
   
Um. Pesar... Dois. Maldição... Três. desastre... Sete. Lamúria... Treze. Desespero...Vinte e dois. Lágrima...Vinte e três. calma. Pim, tocou a campainha que indicava minha chegada ao último andar do prédio. Um nível vazio, obscuro, mofado e inabitado, exatamente como me sentia havia tanto tempo.
    
Caminho pelos gêmeos corredores nuviosos, tendo plena consciência do trajeto que preciso fazer. Chego finalmente à escada que me leva para o terraço e levanto meus passos arrastados por toda sua extensão, até que o céu se abre sobre minha cabeça fervilhante.
     
Tirano azul, limpo. Chega a inspirar certa paz, ainda que momentânea. Á direita, a crista dum prédio um pouco mais alto, à esquerda o vislumbre das montanhas que se vistas mais à frente seriam flagradas cercando grande parte da cidade. Mas era à frente que encontrei o mais curioso.
   Devia partilhar da mesma juventude que eu. Ligeiramente mais encorpado, cabelos esvoaçantes e pele alvíssima. Estava de pé no limite entre o chão do terraço e o baque de encontro à estrada vinte e três andares abaixo.
 









 Outro suicida...

[continua]

Exitium

Author: Henrique Alvez /


Cerne moído
Confronto mortal
Cérebro diluído
Coquetel mental

Guerra interna entre
marvóticos defensores do sigilo blindado
Cidoniano morto
Artista calado.

Tétrico

Author: Henrique Alvez /














A derrotada utopia foi-se enfim
Trégua armígera foi gerada
Adeus para sempre, oh cândido Querubim
Cotidiano, Apenas venha
Não me faça mais nada

Se devaneios já não mais existem
Se ócio tornou-se permanente rotina
É para que se acerque acinzentado horizonte
Parado de mim defronte
Soturna e maculada cortina

Olhos já não podem mais sorrir
Vê-se próprio âmago em taciturno despertar
Espírito fustigante no esperar
Mal vê a hora de partir

Porém o material o prende
Como cárcere inviolável
Indesejada vida ascende
Fado inevitável

E lirismo ainda que restante
Também esgota-se vagaroso
Suficientemente instante
Acompanhante ansioso
De espírito vendado
Do ser humano arruinado.

Henrique Alvez

Estatutário

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É pedra bruta
Alquebra resistente
Fortaleza dissoluta
Opaco reluzente

Instrumento inexorável
Mão nua
Sem arma palpável
Esperança
Vã usança tua

Acaso é o amorfo rosto
Emergente desgosto
Pois figura legítima
Conserva-se Latente

Agora choro, pobre vítima
Estatutário impotente
Aceito-a maldita sina
Abandono a face que se esconde
Como cômoro em neblina

Deito-me sobre os seixos
Folgados motejantes
Aguardando o desfecho
Retorsão cruciante

Nobre seja novo ofício
Retângulo entalhado
Crava-se em solo sagrado
Aguardando futuro exício



Henrique Alvez

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