4º texto: O conto do Suicida

Author: Henrique Alvez / Marcadores:

__A cerimônia de casamento havia terminado. Os felizes recém-casados estavam a caminho do ostentoso salão de festas para desfrutar de seus queridos amigos e do iminente festejo.
__Os convidados se deleitavam com o grande banquete servido no interior do vasto salão, distribuíam-se por centenas de mesas lindamente ornamentadas e enlouqueciam em coreografias desatinadas na pista de dança, enquanto os noivos não se apresentavam.
+_Um deles estava sozinho em sua mesa, pensativo e analítico. Seus amigos não haviam sido convidados para a festa, ou, provavelmente, não tiveram coragem, vontade, ou cara-de-pau para comparecer. Estranhamente, tal homem carregava consigo uma pesada mochila, parecendo esperar o momento certo para abri-la. Trajava um terno preto, um pouco engomado de mais, que caía sobre uma pele trigueira, quase fundida a um invulgar colar de sementes da mesma cor. Seus olhos castanhos vivíssimos dançavam por todo o salão, observando a todos.
__“Os noivos estão chegando!” ouviu-se alguém murmurar, “Vamos limpar a pista para a valsa!” disse mais outro.
__Ao começar o burburinho, o homem solitário empertigou-se e, em um salto, levantou-se da cadeira, andando apressado em direção ao banheiro.
__Enquanto todos os convidados abandonavam suas mesas, interrompiam o descomedido banquete, e se aquietavam na pista de dança, o estranho homem se trocava no retrete apagado. Sobrepunha o terno preto e engomado com roupas femininas exageradas, mirabolantes e extremamente quentes. Entre elas, uma jaqueta de couro marrom, um gigantesco casaco de pele, com um gorro costurado desproporcionalmente ao resto do traje, quilos de cachecóis... Enfim, roupas grandes e grossas de mais. Não demorou muito, para que ele ficasse inidentificável e completamente osco.
__Esperou alguns minutos, e, logo, chegou aos seus ouvidos a doce vibração musical vinda da melodiosa canção orquestrada que já regia a valsa inicial dos noivos.
__Com uma calma palpável, o varão disfarçado de dama incógnita se dirigiu fantasmagoricamente a caminho da pista, mal enxergando graças ao longo capuz. Refletia em cima de tudo o que o havia movido até ali para fazer o que estava prestes a ser feito, buscando coragem para cumprir seu objetivo, e ao mesmo tempo se alimentando dos piores tipos de sentimento, que o dominavam em seu âmago.
__Ao adentrar a pista, sorrateiro, ele se acercou do casal que dançava graciosamente em meio aos convidados, trocando olhares apaixonados e se movendo sincronizados, tão leves que pareciam flutuar a cima do piso reluzente.
__Admirou-os por alguns instantes. A bela mulher vestia-se com um longuíssimo vestido branco que lambia o chão a cada passo dado. O véu transparente que cobria os cabelos castanhos, presos em um coque, escorria até as costas. Seus olhos expressivos lacrimejavam, fitando o noivo de maneira inebriante.
__Ele retribuía o olhar penetrante com a mesma intensidade, mirando-a hipnoticamente com seus profundos olhos verdes. Sua pele branquíssima parecia brilhar sob a luz alva que provinha da dançante luminária sobre eles.
__Aos poucos, os dois tiveram seu espaço invadido pela incomum figura, que se espreitou em meio a multidão até interromper a dança de vez.
__O noivo desviou seu olhar da mulher para o vulto espalhafatoso e, sem soltar a esposa, dirigiu-se ao homem:
– Está nos atrapalhando. Pode nos dar licença? – O homem encapotado apenas tornou a andar até ficar muito próximo aos dois. A mulher se irritou e, soltando-se do marido, disse:
– Não me lembro de você. Como conseguiu entrar em nossa festa? – O homem apenas permaneceu silente, ignorando a mulher completamente, ainda voltado ao nubente como se o mesmo fosse um objeto a contemplar.
– Preciso falar com você – Disse, finalmente, o homem trajando vestes femininas.
– Precisava ser justamente agora? – indagou o noivo incrédulo.
– Não tomarei muito o seu tempo.
__E dizendo isso, o homem caminhou vertiginosamente em direção ao noivo, de forma que o parolar de suas longas vestes arrastadas no chão faziam-no parecer deslizar sobre o mesmo.
__Já extremamente próximo ao noivo, ele meteu a mão em um dos bolsos do casaco de pele exagerado, retirando um objeto cintilante de dentro deste, e ocultando-o na manga das vestes logo depois. Então, sem nenhuma explicação, precipitou-se em direção ao homem, em um demorado e caloroso abraço.
– Foi uma lástima você ter destruído um laço tão forte – Sussurrou o homem para o nubente, fazendo-o parar, tamanha era sua perplexidade – Lamento que amizade, para você, não valha sequer o chão que pisa.
__E com o final da frase veio a surpresa: Em um movimento rápido, o homem revelou o objeto retirado do bolso momentos antes, que para o terror de todos, se tratava de uma afiada e agigantada adaga, que cintilava com o brilho da luz que ainda não parara de iluminar a cena.
__Com um gesto inesperado, quem a segurava cravou-a no pulmão do noivo, fazendo-o bradar intensamente e cair no chão logo após, tingindo o piso branco com a cor rubra de uma rútila e gigantesca poça de sangue.
__A cena desencadeou um grande tumulto. A pista de dança foi dominada por murmúrios e gritos de horror. Por sua vez, a noiva soltou um berro cortante e, desatrelando lágrimas como uma cachoeira, correu resvalante em direção ao marido, debruçando-se sobre seu corpo logo após golpear o homem osco fortemente, debulhando-se em lágrimas e banhando-se com o sangue do marido de maneira perturbadora.
__Após um tempo, seu pranto passou de escandaloso a retraído, e ela agora acariciava o corpo do amado, enquanto todos os convidados permaneciam em seus lugares, incapazes de intervir em tal cena tão chocante.
__O vulto heteróclito fitou a mulher, lançando-a um olhar de profunda condolência, e dirigiu-se até ela lentamente, sob os espantados e curiosos olhares dos convidados. Chegando próximo à noiva, fez outro gesto inesperado, seu braço perfurou o ar em direção a mulher, em um inacreditável sinal de apoio.
__A festa congelou. ouvia-se agora apenas o barulho externo vindo do matagal que cercava o salão. A noiva olhou perplexa para a mão estendida, depois migrando o olhar para o rosto oculto que fitava com uma Selvageria intimidadora.
__A viúva virou-se bruscamente para o vulto, correu em sua direção, e o agarrou brusca e violentamente, chorando confusa e vociferando:
– COMO VOCÊ TEM A CORAJEM DE INVADIR NOSSO CASAMENTO, MATAR O MEU NOIVO, E ME ESTENDER ESSA PATA IMUNDA, NO FINAL?! QUE TIPO DE MONSTRO DOENTE É VOCÊ?!
__Ela não o soltara por um minuto, se debatia e o agredia selvagemente, ao mesmo tempo em que ele apenas recebia a agressão, calado.
__Em meio aos golpes, insultos e gritos da mulher, o homem sacudiu a cabeça a fim de fazer com que o capuz deslizasse sobre a mesma. Quando seu rosto se tornou visível, os murmúrios de horror e surpresa invadiram o salão mais uma vez. Ele, por sua vez apenas tocou o peito com oqueixo, e com uma profunda expressão de dor, deixou escorrer uma lágrima pelo rosto, dizendo:
– Você vai entender os meus motivos...
BANG!
__Ouviu-se um ensurdecedor fragor vindo do desconhecido, provavelmente do matagal. O homem disfarçado apenas parou perplexo enquanto a mulher o fitava apavorada. Ele contemplou o próprio estômago, observando o orifício sangrento aberto no mesmo pela bala que acabara de atingi-lo. Ela, acompanhou seu olhar, horrorizando-se com a fresta brilhante que se abrira no ventre à sua frente.
__Os dois se encararam com os olhos esbugalhados. Ela soltou-o atemorizada, deixando-o esparramar-se, inerte e perecido no chão, respingando sangue ao se chocar com a poça púrpura recém formada.

Henrique Alvez

26 comentários:

@marcosdevon disse...

NOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOSSAAAA!!!
Cara, tu escreve muito bem! :o
Tipo assim, ele invade o casamento, mata o cara, se mata... e fim? noosa, mas quais os motivos dele? :o (ele gostava dele né? hm kkkkkkkk brincs)
Gostei cara, parabéns. to seguindo seu blog! *O*

Visite o meu tbm. rs


Abraços! ^^

C. Camargo disse...

NOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOSSA!!! [2]

Muito, muito bom, adoooreii!!

Teu blog é muito bom, to seguindo também!!

Quando puder passa lá no meu tbm, é de contos tbm!! ^^

grande abraço

http://spetaculaire.blogspot.com/

Anônimo disse...

Seu blog é tão bom que conspira contra os ruins, nem ao menos me deixando fazer um comentário sem ser no anonimato, haha.

Crime digno de Sam Bourne.

ps: anonimo = francisco, para esclarecer

Jonathan disse...

ao meu ver, achei muito bom, porém, não acompanho o conto desde o inicio...

acho que para blogs, essa não é uma boa, mas enfim...

Passe no meu blog: http://librianodoamor.blogspot.com/

A-nanda disse...

Valei-me ciço q fodão cara
qando vi pensei logo grande demais vou nem terminar, mas é tão envolvente que c ler e nem percebe( eu sei q c ta pensando, eu sou sim preguiçosa ^^)
adorei vim aqui so comentar mas vou seguir pra depois vim aqi mais vezes.

Vinicius Oliveira disse...

po cara, parabéns, voce é muito bom cara

Anônimo disse...

Você se expressa muito bem.
Lindo dom.
Parabéns.

Anônimo disse...

Belo texto. Não escrevo tão bem quanto vc, mas se puder dar uma conferida em meu humilde blog, rss! É pobre mas é limpinho. Abraços!

Anônimo disse...

estou impressionada com a tua criatividade!
Ótimo texto, de verdade. Você tem talento, hein..hehe
Enfim, adorei teu blog e já estou seguindo..
se quiser passa lá no meu; http://bruhmbnb.blogspot.com
bjos;abraços

Esther Saldanha disse...

Quanto sangue *-*
Está muito bem escrito caro vizinho ;]

haha, ainda bem que eu nunca fui a favor de casamentos ;]

abraços

Giuliano Marley disse...

Você escreve exageradamente bem. Eu gostei muito.
_____
http://atestadopedante.blogspot.com/

Lucas Rodrigues disse...

Caralho, tu escreve muito bem cara...

Sem sacanagem, um dos melhores blogs desse gênero que já...

Parabéns cara

Anônimo disse...

Henrique, nem preciso dizer o quanto te admiro, né!?
Apesar de você me chamar de nomes não muito dignos. Adoooro você e já te disse isso. Conta comigo sempre.
Sucesso,Marinexx :P
Ps.: eu sei que isso não tem nada a ver com o conto, mas...
Ps².: a noiva ficou traumatizada depois disso :/

Vinicius Oliveira disse...

Po cara voce escreve MUITO bem, é um dom que voce tem hein, aproveite muito esse dom

http://viniciusoliveiraa.blogspot.com/

Vinicius Oliveira disse...

Mas olha é verdade mesmo cara, voce é muito bom nisso.

http://viniciusoliveiraa.blogspot.com/ se der pra voce divulgar pra quem gosta de futebol, eu agradeço

Anônimo disse...

Bem descritivo, o "pata imunda" foi cômico.

Malu e Eliana disse...

Muito bom mesmo, adorei!

Adubados® disse...

nossa! mt bacana seu texto..
parabéns!

Adubados®
...pois nem todo adubo é merda!
http://adubados.blogspot.com

Bersebah disse...

Devido a sua impecavel habilidade na escrita, tendo mesmo de me sensibilizar com seu elogio ao textos em meu blog.
Parábens, não imaginava encontrar alguem com um sentimento, uma expressivida tão grande em seus contos, como da forma que você desempenhou, isso realmente é muito raro.

Está de parábens mesmo.

Fico pensando apenas no misterio que se estendeu ao final do conto, e diferente dos demais, pensando no trecho "Ouviu-se um ensurdecedor fragor vindo do desconhecido, provavelmente do matagal. O homem disfarçado apenas parou perplexo"
Penso que ele foi baleado, por alguem, afinal, o matagal "cercava o salão", sendo assim, se o som veio do matagal, suponho que o tiro veio de outro pessoa, e não do transloucado, e sinistro, de propositos misteriosos.
Ainda mais pelo "O homem disfarçado apenas parou perplexo", ele não ficaria desta forma, se fosse ele a disparar o tiro contra si.

Enfim, interpretação minha, mas, se há algo de correto, e coerente em minha interpretação, eu vou desejar saber o misterio, que ficou na morte do "travesti".

Um abraço, e obrigado pela visita, sinta-se a vontade em aparecer quando desejar.

fabis disse...

Muito bom o texto parabens


http://afffveioo.blogspot.com/

joão victor borges disse...

cada texto que leio por aqui é uma ótima surpresa. nossa, o desenrolar da história é tão envolvente que eu tive o impulso de mandar todo mundo calar a boca aqui em casa pra eu ler direito.

sério, adorei o conto, muito bem escrito e único nos detalhes. me senti como se fosse um dos convidados inválidos dessa festa.

aliás, agora fiquei curioso pra saber os motivos desse assassino-suicida :o

parabéns :D

http://anpulheta.blogspot.com

Pobre esponja disse...

Seus quatro posts últimos falam, de diversas formas, da finitude humana, do tempo. Nota-se aí já uma característica poética sua.

abç
Pobre Esponja

Vinicius Oliveira disse...

estou sempre aqui, parabens pelo blog HAHAAHAHA
http://viniciusoliveiraa.blogspot.com comenta ae? por favoooor

Jean Leal disse...

Me pareceu interessante, lerei desde o começo.

Jess disse...

cara amei o blog mas choquei com a história.. quia eram os motivos dele???? pooxa, to mto curiosa agora.. isso é maldade.. rs
to sgeuindo o seu blog...

o meu:

www.agentenaofofoca.blogspot.com

Anônimo disse...

Sua linha literária é moderna, isto é, bom para textos como contos, traduzem uma nova forma de contar um cenário tematicamernte bem reproduzido...

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